'Ficamos em choque': paraenses alvo de falas xenofóbicas e racistas de torcedora do Avaí comentam o caso
19/11/2025
(Foto: Reprodução) 'Olha a tua cor': torcedora do Avaí grita falas racistas e xenofóbicas à torcida do Remo
Paraenses alvo de falas xenofóbicas e racistas de torcedora do Avaí durante a partida do time contra o Remo, clube do Pará, pela série B do Brasileirão, falaram sobre o momento ocorrido dentro do estádio em Florianópolis no último sábado (15).
"Quanto mais cantávamos as músicas da nossa torcida, mais eles diziam que nós 'não merecíamos estar ali'. As ofensas eram constantes, humilhantes e claramente motivadas pela nossa cor e origem", contou o paraense Abraão Jaques, de 30 anos.
Abraão viajou a SC para acompanhar o jogo a convite do primo Maurício Ferreira, também paraense de 30 anos, mas que mora em Florianópolis há quatro anos. Maurício é empresário na cidade, presenciou o momento dos ataques e revelou ao g1 que não escuta estes tipos de comentários e xingamentos apenas dentro dos estádios:
"Já ouvi perguntas como: 'O que você veio fazer aqui?' ou 'Por que veio de tão longe?'. Eu sempre respondo que vim pelo mesmo motivo dos antepassados de muitos daqui — vindos dos Açores ou da Alemanha: em busca de melhores oportunidades e qualidade de vida."
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Além do primo, Maurício levou para a partida funcionários da própria empresa para torcerem pelo Remo naquele dia. Durante a partida, a torcedora do Avaí, identificada como Ana Costa, foi filmada falando uma série de xingamentos racistas e xenofóbicos contra paraenses e torcedores do time rival.
Um homem que estava perto da torcedora, vestido com uma camiseta escura e que ainda não foi identificado, também aparece no vídeo gritando frases xenofóbicas, enquanto outro, vestido de amarelo, alerta sobre as falas.
As ofensas gravadas incluem frases como:
"Vai de jegue?"
"O que é que tem no Pará? Seu feio!"
"Gastou o salário para vir, agora vai embora a pé"
"O prefeito não quer aqui em Floripa tu" (em alusão a um vídeo do prefeito sobre assistência social)
"Olha a tua cor"
"Pobre aqui não fica"
"Quer comer? Está com fome? Ali tem a comidinha de graça"
"Foi um sentimento de descrença e estarrecimento. Não estávamos acreditando que ela estava falando aquelas coisas, externalizando todos aqueles pensamentos em pleno século XXI. Ficamos em choque com as palavras dela", relembrou o empresário.
Ele estava sentado próximo à divisão de torcidas e conseguiu presenciar e ouvir o que a mulher disse. Ela estava em um "camarote" no estádio e gritou em direção à arquibancada.
"O paraense é acostumado com a zoeira e a encarnação, algo comum e presente no futebol entre torcidas rivais. Mas o que aconteceu naquele episódio com a fala daquela torcedora ultrapassou completamente qualquer limite aceitável", pontuou Maurício.
Abraão completou:
"Apesar dela desferir as palavras para nós que estávamos próximos dela, eu senti o peso por todo um povo, por todos os paraenses. [...] Que ela sofra as punições junto ao clube."
O que dizem os times envolvidos?
O Avaí repudiou os atos e lamentou o ocorrido, reiterando que está alinhado com as autoridades e repassando informações. Disse também que o "racismo é um crime grave que não pode ser tolerado dentro ou fora dos estádios".
Sobre os dois torcedores, o clube informou que, após a identificação, eles terão os acessos aos eventos do clube, como jogos e atividades, suspensos por tempo indeterminado.
Remo publicou nota oficial sobre o assunto.
Reprodução / Redes sociais
O Clube do Remo divulgou uma nota oficial que classifica o ato como "repugnante" e uma "clara manifestação de racismo e intolerância". O time exigiu uma punição exemplar dos envolvidos e reafirmou o compromisso inegociável na luta contra todas as formas de discriminação, além de destacar que "que se orgulha de representar a região norte e, principalmente, o estado do Pará".
Investigação
O Ministério Público de SC (MPSC) anunciou a instauração de um procedimento administrativo pela 40ª Promotoria de Justiça da Capital para "apurar possível crime de racismo em decorrência de suposta xenofobia".
A Polícia Civil (PC) de SC, por meio da Delegacia de Repressão ao Racismo e a Delitos de Intolerância (DRRDI) da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (DEIC), também investiga o caso e a conduta da torcedora do Avaí, bem como de outros envolvidos nas hostilidades.
A Defensoria Pública do Pará oficializou um inquérito que solicita providências à Defensoria de Santa Catarina contra as falas, além de punição aos envolvidos.
O prefeito de Florianópolis, Topázio Neto, citado nas falas da torcedora, também se manifestou. Em suas redes sociais, pediu desculpas "em nome de Florianópolis" ao povo paraense e aos torcedores do Remo, reforçando que o caso deve ser "investigado e a criminosa, punida". Ele reforçou que "esse tipo de comportamento tem que ser condenado por todos nós todos os dias".
O que diz a defesa da mulher flagrada no vídeo?
NOTA À IMPRENSA
A defesa de Ana Costa, torcedora do Avaí Futebol Clube, vem a público esclarecer os fatos relacionados ao vídeo que circula nas redes sociais.
O registro divulgado não retrata quem Ana é, nem seu comportamento habitual. Durante a partida realizada em 15/11/2025, no Estádio da Ressacada, diversos conflitos paralelos ocorreram no interior do estádio, gerando um ambiente de tensão que alterou o estado emocional de muitos torcedores, incluindo Ana.
Especificamente quanto ao episódio divulgado, é importante esclarecer que Ana foi alvo de agressões verbais e ataques pessoais momentos antes. Parte desses acontecimentos não aparece nas gravações, que mostram apenas um recorte isolado e incompleto da situação.
O que se vê no vídeo decorre de uma agressão mútua e pontual, envolvendo pessoas específicas, e não representa qualquer manifestação dirigida à torcida do Remo ou aos paraenses de maneira geral.
Ana Costa reforça que não possui qualquer tipo de preconceito, mantendo profundo respeito por paraenses e catarinenses, bem como pelas torcidas do Avaí e do Clube do Remo. Lamenta profundamente o ocorrido e esclarece que jamais teve a intenção de ofender qualquer pessoa ou torcida.
Desde já, Ana manifesta publicamente seu pedido de desculpas a todos que se sentiram atingidos, reafirmando que o episódio não reflete seus valores pessoais. Por fim, coloca-se à disposição das autoridades competentes para quaisquer esclarecimentos necessários.
São José/SC, 18 de novembro de 2025.
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